Imagine que agora, neste momento, você está em Santos ou no Rio de Janeiro, cidades úmidas. E você tem uma amiga ou um parente passando por Brasília, região seca. E a queixa de vocês, no mesmo dia e mesmo horário, é igual – dor de cabeça. Será que vocês devem receber o mesmo tratamento? Provavelmente não. De acordo com o Ayurveda, a saúde do indivíduo é influenciada por local (cidade; geografia), clima (estação do ano), alimentação e circunstância (emoções). Por isso, na hora de prescrever um tratamento a um paciente, além de se informar sobre o momento da sua vida, é fundamental investigar a geografia e o clima.
O ar de Brasília é seco e o Rio de Janeiro está localizado num território úmido. Dessa forma, o médico precisa levantar informações para entender o que desencadeou uma aparente inofensiva dor de cabeça e como isso está afetando o organismo do indivíduo. E provavelmente a localização e as condições climáticas são determinantes nesse processo, pois elas influenciam os doshas e a saúde humana.
Vamos nos aprofundar um pouco mais no assunto? Como o entendimento da natureza e da relação do indivíduo com a natureza é fundamental no tratamento ayurvédico das doenças?
Em lugares áridos (jángalam*), desérticos e desprovidos de água, há a predominância do dosha Vata (ar + éter). As estações frias, secas e com vento, como o outono, tendem a agravá-lo, com isso causando secura dos tecidos, gerando contraturas e dor, nesse caso a dor de cabeça seria em aperto ou pressão. Evitar temperaturas excessivamente baixas e manter-se aquecido são ótimas recomendações para acalmar o Vata. Em geral, ele também sente alívio com saunas (úmidas e quentes).
Regiões com altas temperaturas agravam o dosha Pitta (fogo). O verão é o período mais difícil. O calor úmido pode facilmente causar desequilíbrio. A temperatura corporal aumenta, tornando-o mais suscetível às doenças e desequilíbrios relacionados a inflamação, nesse caso a dor de cabeça teria característica pulsátil. Emocionalmente, pode se sentir irritado, agitado e raivoso. A mente aguçada tende a se tornar hipercrítica e julgadora. Para acalmar tudo isso, o dosha Pitta precisa de ambientes frescos, alimentação e plantas medicinais refrescantes.
Ambientes úmidos (ánupam*), pantanosos e com excesso de água (ulbana*) são características do dosha Kapha (água + terra). Já percebeu como sua pele fica mais úmida e “grudenta” quando você está em cidades como Rio de Janeiro, Santos ou Manaus? Isso acontece porque o Kapha está desequilibrado. O pior período do ano para o Kapha é o início da primavera, quando a umidade está alta e a temperatura é baixa. As dores de cabeça são relacionadas com os atributos da água como resfriados, rinites, sinusites e outras desordens envolvendo muco como, por exemplo, a bronquite. Emocionalmente, é retentor, pegajoso e “gruda” afetivamente.
O equilíbrio (sama*) dos três doshas é encontrado no Sádhárana* – terreno normal, nem tão úmido e nem tão árido. Mas isso não significa que o corpo está em plena harmonia. Existe uma dança dos doshas dependendo da região
Portanto, a recomendação de tratamento para dor de cabeça ou qualquer outra queixa do indivíduo deve ser tratada de maneira diferente, caso tenha relação com o clima do local geográfico (bhudesha*) e com a estação do ano. A orientação/prescrição do profissional e as dosagens dos medicamentos serão diferentes. A resposta da pessoa ao tratamento será impulsionada ou agravada pelo ambiente em que ele está.
Vamos fazer um rápido exercício e pensar num distúrbio de vata – ar + éter (seco, deserto, árido): lesões de pele por secura, como na dermatite atópica.
O que acontece?
– O ambiente úmido ajuda no tratamento. Cidades como Santos, Manaus ou Rio de Janeiro, o dosha Kapha predomina, ou seja, “empurra” e ajuda o vata.
– Lugares secos e áridos “empurram” a ter um agravamento de Vata. Os sintomas pioram, ou seja, a pele ficará mais seca e com descamações.
Secura, umidade, calor e frio do ambiente são relevantes e decisivas quando olhamos para nossos padrões de comportamento e organismo. Tente observar isso no seu dia a dia e procure saber como equilibrar essa equação. Em caso de dúvidas, entre em contato pelo email clinicasoha@gmail.com ou pelas mídias sociais.
Você sabia?
Em sânscrito, a palavra ulbana também significa “a membrana que cobre o feto” – algo abundante, excesso, película que envolve e protege. Por isso, esse termo é atribuído ao dosha Kapha – uma abundância que cobre, envolve, como uma “gelatina”.
*Termos originais, em sânscrito, citados no Ashtanga Hrdayam (um dos três principais livros do Ayurveda, escrito há aproximadamente 1.500 anos, por Vagbhata, integralmente em versos). Trecho retirado da seção (sutrasthana) 1:23 – capítulo 1, segunda metade do verso/sloka 23 e primeira metade do verso/sloka 24.